Cruzeiro do Sul, AC, 25 de novembro de 2024 00:11

Portal da Câmara Federal revela ressarcimento de mais de R$ 120 mil a Jéssica Sales com impressos

Compartilhe

Parlamentar teria gasto o valor com a confecção de um jornal de divulgação do mandato; publicação, se existiu, não apareceu no Acre

Deputada Jéssica Sales: família unida até na hora de suspeitas de desvio de dinheiro do contribuinte - Foto: Divulgação
Deputada Jéssica Sales: família unida até na hora de suspeitas de desvio de dinheiro do contribuinte – Foto: Divulgação

Tião Maia, especial para o Página 20  

Mais de R$ 120 mil, verbas da cota da atividade parlamentar, teriam sido acrescentados, nos últimos cinco meses, ao patrimônio da família Sales, de Cruzeiro do Sul, a partir de pedido de ressarcimento de verbas da cota do exercício da atividade parlamentar do gabinete da deputada federal Jéssica Sales (PMDB-AC).

A filha do prefeito Vagner Sales teria levado o dinheiro público para casa a partir de notas frias em que alega ter gastado o montante de recursos com a impressão de 190 mil exemplares referente à impressão de três edições de um jornal do tamanho tabloide, confeccionado em papel couchê 150 gramas, em cores, de oito páginas, cujos exemplares, conforme constatado junto ao sistema de controle da Fazenda Estadual, jamais chegou ao Acre via terrestre, aérea ou fluvial.

Os 190 mil exemplares dos informativos, até então constatados como inexistentes, foram ressarcidos à deputada federal pela Câmara sob a rubrica de “divulgação da atividade parlamentar”.

As irregularidades são reveladas a partir da análise da divulgação do portal de transparência da própria Câmara dos Deputados, hospedado na internet, a rede mundial de computadores, conforme exigência legal. Lá está escrito que a deputada, no mês de junho de 2015, gastou R$ 57.600 com a impressão de 90 mil exemplares do informativo que ninguém viu – nem no Acre ou em Brasília. O mesmo já havia acontecido em março, um mês após a posse da deputada, na data de 1 de fevereiro de 2015. Mesmo que fevereiro seja um mês atípico, com menos de 30 dias e descontado o fato de que, como deputada de primeiro mandato, ela tinha pouco ou nada a apresentar para divulgação de atividades que mal havia inciado, Jéssica Sales apresentou, para ser indenizada como gastos das verbas da cota para o exercício da atividade parlamentar, a quantia de R$ 36 mil com a impressão de 50 mil jornais, do mesmo formato tabloide e com as mesmas oito páginas. Em abril, novas despesas, no mesmo valor e com a mesma quantidade de jornal. O parceiro de partido de Jéssica Sales, o ex-governador e ex-senador Flaviano Melo, mesmo com o acúmulo de três mandatos de deputado federal e certamente com muito mais notícias a dar em termos de divulgação de seu mandato, não gastou tanto quanto a novata deputada do Juruá. Ele preferiu gastar, no quesito “divulgação da atividade parlamentar”, R$ 35 mil, à guisa de pesquisas, à empresa Datacontrol, que funciona no conjunto Nova Esperança, em Rio Branco.

Aliás, o outro aliado de Jéssica Sales, o deputado Major Rocha, do PSDB, não se atreveu a tanto. Enquanto Jéssica Sales chegou a quase R$ 120 mil, seus outros dois aliados não alcançaram, juntos, R$ 50 mil. Quando comparados com os gastos dos deputados da Frente Popular do Acre, os números de Jéssica Sales se tornam cada vez mais estratosféricos. No mês de junho de 2015, quando Jéssica Sales apresentou a conta de mais de R$ 57 mil, o deputado Raimundo Angelim, ex-prefeito de Rio Branco e um dos mais votados de 2014 no Acre, se retringiu a pouco mais de R$ 5 mil.

A nota fiscal da empresa na qual os jornais teriam sido impressos, a Gráfica Eco Editora e Impressos LTDA-ME, situada na quadra 03 do Conjunto “A” Lote e 21, Loja 02, setor gráfico, no Núcleo dos Bandeirantes, no Distrito Federal, é outro libelo contra a deputada e seu pai prefeito. Se for considerado o peso estimado para cada exemplar impresso, a papelada onde estariam impressas as atividades de menos de seis meses da nova deputada, seria da ordem de mais de 30 mil quilos – 30 toneladas. Peso suficiente que, para vir de Brasília a Rio Branco, teria que ser trazido numa carreta.

– Por aqui, isso não passou – disse um fiscal da receita estadual, lotado na divisa entre Acre e Rondônia, no Posto Tucandeiras, única entrada de mercadorias para Rio Branco e a partir da Capital para o restante do Estado, como a cidade de Cruzeiro do Sul, a qual os jornais se destinariam já que é lá que a parlamentar tem base eleitoral. O fiscal fez a declaração ao ser confrontado com a nota da empresa Eco.

– Essa nota fiscal não permite o envio deste material para o Acre. É uma nota que autoriza a circulação a mercadoria apenas entre o Núcleo dos Bandeirantes, onde foi impresso, para o endereço do cliente – disse o secretario de Fazenda do Acre, Joaquim Manuel Macedo, o Tinel. O endereço do cliente, no caso, é o gabinete da deputada, no anexo IV da Câmara dos Deputados, numero 952. Os jornais, também não foram enviados pelos Correios já que não há contrato entre a Câmara, a deputada e a ECT – a Empresa Brasileira de Correios.

– Não vi nenhum exemplar deste jornal aqui em Cruzeiro do Sul. Se foi impresso, não foi distribuído aqui – disse o presidente da União das Associações de Moradores de Cruzeiro do Sul (Umam), Expedito Ribeiro.

– Aqui também não chegou qualquer publicação da deputada Jéssica – disse o presidente da Câmara Municipal de Cruzeiro do Sul, vereador Romário Tavares, do PSDB e aliado do prefeito Vagner Sales.

– Talvez esteja a caminho – acrescentou.

É possível. Mas tamanha quantidade de papel, mais de 30 toneladas, para vir de Brasília a Rio Branco, teria que ser numa carreta. No gabinete da deputada, pelo menos até ontem, segundo fontes em Brasília, não se via quaisquer movimentação em relação à armazenagem de tanto papel, posto que no gabinete da deputada, no anexo IV da Câmara Federal, não caberia no local por absoluta falta de espaço.

Como os tais jornais não chegaram ao Acre, pela prosaica dedução de que não foram impressos, o que se conclui, por lógica,  é que a nota fiscal da empresa  Gráfica Eco Editora e Impressos LTDA-ME, principalmente pelo histórico da empresa, já envolvida em escândalos da mesma natureza – basta rápida pesquisa na internet usando a ferramenta google -, nada mais é do que uma nota fria a justificar desvios de verbas públicas para o patrimônio da família Sales.

–  Com certeza, isso é para o pagamento das despesas da campanha milionária que elegeu essa moça em tempo recorde – disse o vereador Valdemir Neto, do PT de Cruzeiro do Sul.

No primeiro mês de mandato, a deputada já tinha o que divulgar: R$ 32 mil levados para casa
No primeiro mês de mandato, a deputada já tinha o que divulgar: R$ 32 mil levados para casa
2
2
Em abril, conforme a nota fiscal, a deputada editou a mesma irregularidade do mês de março e voltaria repetir o mal feito em junho de 2015, com o pagamento de R$ de mais de 56 mil a uma gráfica suspeita do Nucleo Bandeirantes, em Brasília; notas da mercadoria da mercadoria só permitem circulação no DF
Em junho de 2015, a deputada bateu um recorde: mais de R$ 56 mil pagos por um jornal cuja edição e distribuição ninguém viu, nem no Acre ou em Brasília