O prefeito de Cruzeiro do Sul, Vagner Sales (PMDB), perdeu uma ótima oportunidade de esclarecer o porquê de sua cidade estar vivendo uma das maiores epidemias de dengue no país. Ele participou de uma sessão especial da Assembleia Legislativa do Acre (Aleac) convocada especialmente para ouvi-lo a respeito. Além dele, também foi ouvido o coordenador-regional da Secretaria de Saúde para a região do Juruá, Itamar de Sá.
A sessão foi proposta pela deputada estadual Eliane Sinhasique (PMDB), depois que Sales foi acusado de omisso ao permitir que a situação da dengue praticamente ficasse fora do controle. No jargão popular, pode-se dizer que Sinhasique botou Vagner Sales numa roubada, ou que agiu como amiga da onça.
O prefeito passou vergonha por não ter sido capaz de formalizar argumentos capazes de justificar o descaso de sua administração frente a uma questão de saúde pública tão importante. Itamar de Sá, por sua vez, apresentou dados e informações que comprovariam a omissão de Sales como gestor e a sua incapacidade de enfrentar os problemas de Cruzeiro do Sul.
O prefeito foi desmoralizado e não teve como reagir. Ele teria 15 minutos iniciais para apresentar seus argumentos e, ao final, mais 10 para as considerações finais. Entretanto, preferiu usar todo o tempo de uma só vez e ainda mais dois minutos concedidos pela mesa diretora da Aleac e ficou sem tempo para contrapor as afirmações de Itamar de Sá. Os membros da oposição que usaram a tribuna, também não foram capazes de justificar o injustificável e acabaram apenas por reclamar por mais tempo para o prefeito continuar sua falação. Nem mesmo Eliane Sinhasique pôde falar, haja vista que um acordo firmado antes considerou que apenas os líderes partidários ou de blocos poderiam se manifestar.
Nos 27 minutos de discurso inflamado, Vagner Sales alegou que não recebera apoio do governo, e foi textual ao dizer que se negou, por diversas vezes, a assumir o combate à dengue e à malária em seu município.
“Eu vim aqui para mostrar a situação de um problema que nós temos em Cruzeiro do Sul, que é o problema da dengue, que sabemos ser um problema do Brasil, onde 77% dos municípios enfrentam são afetados”, disse Vagner Sales.
Itamar de Sá, no entanto, disse que todo o apoio que o governo do Estado poderia ter dado à prefeitura de Cruzeiro do Sul foi dado e apresentou uma série de documentos que comprovam sua afirmação. Parte desses foi entregue à mesa diretora da Aleac para análise posterior. Outra parte, ele usou para se contrapor às afirmações de Vagner Sales, exibindo-os para que todos pudessem tomar conhecimento.
“É ruim a gente ouvir colocações que não informam, que só desinformam, e o que o prefeito fez em sua participação aqui foi tentar desinformar. Fez uma grande confusão a respeito desse tão importante tema que está sendo discutido aqui”, afirmou Itamar de Sá.
Ele lembrou que medidas na área de assessoria técnica por parte do governo do Estado foram tomadas para ajudar a combater a dengue em Cruzeiro, entre elas a capacitação de agentes de endemias do município, aplicações de inseticidas nos bairros, realização do Levantamento de Índice Rápido de Aedes aegypti (LIRAa), além de mobilizações sociais para que a comunidade eliminasse os focos de dengue e conhecesse os sintomas e meios de proliferação do mosquito.
“É ruim a gente ouvir colocações que não informam, que só desinformam, e o que o prefeito fez em sua participação aqui foi tentar desinformar”, afirmou Itamar de Sá
No período mais crítico do surto da doença, o governo do Estado abriu uma unidade de referência 24 horas para atender casos de suspeita de dengue em Cruzeiro do Sul, o Hospital de Dermatologia Sanitária. Somente nessa unidade foram registrados 16.022 atendimentos e mais de 4.500 internações.
Ainda em sua fala, Itamar de Sá lembrou que, desde 2012, Vagner Sales vem se recusando a atuar no combate à dengue, mesmo estando estabelecido pelo Ministério da Saúde que as ações de atenção básica à saúde são de responsabilidade dos municípios.
“Cruzeiro do Sul é o único município do Brasil que não abraçou esses dois problemas de saúde pública [combate à malária e à dengue].”
Os dados apresentados por Itamar de Sá apontam que, no período de 2014, o governo do Estado investiu mais de R$ 12,2 milhões em Cruzeiro do Sul. Já os recursos de investimentos de custeio do governo federal no mesmo período ultrapassam a casa dos R$ 42 milhões.
“Eu vim aqui para mostrar a situação de um problema que nós temos em Cruzeiro do Sul, que é o problema da dengue” (Vagner Sales)
138 dias ausente da prefeitura de Cruzeiro do Sul
A omissão de Vagner Sales no combate à dengue e à malária se deu, principalmente, por sua ausência na cidade. O prefeito esteve ausente de Cruzeiro do Sul por 138 dias no ano de 2014.
Nos meses de junho, julho, agosto e setembro, por exemplo, período em que Vagner Sales passou 74 dias longe da cidade, o número de casos de dengue registrados foi de 10,8 mil. De janeiro daquele ano até abril de 2015, foram notificados 37.501 casos da doença em Cruzeiro do Sul. Esse número representa mais de 70% de todos os casos registrados no Acre, colocando o Estado entre os de maior incidência de dengue no país.