Cruzeiro do Sul, AC, 24 de novembro de 2024 09:39

Em tres hectares de cultivo de seringueira, Duda tem o triplo de árvores de sua velha colocação – Fotos: Arison Jardim

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Em tres hectares de cultivo de seringueira, Duda tem o triplo de árvores de sua velha colocação – Fotos: Arison Jardim
Em tres hectares de cultivo de seringueira, Duda tem o triplo de árvores de sua velha colocação – Fotos: Arison Jardim

Em seu pequeno seringal de cultivo, a exemplo de 1500 famílias extrativistas que estão plantando seringueiras com apoio do governo do Acre, o seringueiro Antônio Mendes, o Duda, vai extrair em sua colocação 300 kg de borracha por ano; e no futuro, quando suas seringueiras plantadas estiverem em ponto de corte, poderá produzir, em um hectare, 2.000 kg de borracha seca por ano.

“Essas árvores plantadas assim, tu corta em uma manhã. Tu olha esse meu plantio aqui, com 610 árvores (em 1 hectare): vou poder cortar sozinho, mesmo na minha idade. Vou vir de madrugada, com a lanterninha na cabeça, risco e quando for 8h estou tranquilo em casa. A diferença está lá na produção, cada árvore pode me dar 250 gramas. Se for isso mesmo, sei que estou ganhando dinheiro”, relata.

As respostas também são visíveis na ponta dessa estratégia. Lá na terra do extrativista (Seringal Cachoeira, em Xapuri) ele tem três hectares de seringueiras e outras frutíferas plantadas. Em 2017, já vai poder “sangrar” (extrair) o látex de suas novas árvores. Nesse meio tempo, ele pode contar um pouco de sua história.

Há 60 anos, sua família veio de um seringal mais distante, o Santa Fé, quase na Bolívia, para a região mais próxima da zona urbana. Casado e com sete filhas, Duda esteve ao lado de seu primo Chico Mendes nas lutas contra a tomada de suas terras para o avanço da pecuária predatória. “Quem enriquece a terra, enriquece também o ar e todos vivem bem”, relembra o morador da floresta. A consciência ambiental e social é uma das conquistas das batalhas vencidas pelos trabalhadores rurais do Acre e que permeia cada etapa do desenvolvimento sustentável do estado.

“Quando iniciamos, eram 55 propriedades, hoje são mais de 88 em 24 mil hectares desse assentamento. Nós pensamos em enriquecer essa área, porque, imagina, minha filha casa e já tenho uma colocação para ela, aqui na minha área. Dá pra sobreviver aqui, porque não dá pra sair para outro canto”, afirma o produtor, querendo a família e os amigos por perto.

Mesmo vivendo distante da cidade, Duda acredita estar no melhor lugar para criar sua família. Com a renda que consegue da castanha e do látex, tem uma vida digna e atualmente mantém sua filha mais nova em uma universidade em Brasileia, a cerca de 110 km. Toda quarta-feira, a menina sai da colocação, pelo ramal até a rodovia (BR-317) e segue para a aula, retornando no mesmo dia.

“Toda madrugada, acordo e me benzo, dando graças a Deus por esse movimento que nós tivemos no Brasil”. Duda fala com propriedade, é personagem na luta para manter a floresta em pé. Foi preso, participou de empates, não só no Cachoeira, mas como parceiro em vários outras colocações para não ver os amigos perderem as terras.

Duda recebe a “cabrita” (faca de sangra árvore) de uma das filhas para iniciar o corte da seringueira
Duda recebe a “cabrita” (faca de sangra árvore) de uma das filhas para iniciar o corte da seringueira

Hoje, em sua casinha arrumada, com varanda e um pomar carregado, pode observar as gerações futuras passarem e ver que está fazendo sua parte. “Eu acho bonito quando vejo os alunos voltando da escola e invadindo o sítio, subindo nesses pés de árvores, comendo, chupando tangerina. Eu penso: Fiz algo que deu certo, que é alimentar esse pessoal que estuda”, diz Duda.

Ele alimenta a crença na prosperidade na floresta e quer que outros extrativistas acreditem nisso:

“Temos que levar nossa experiência para aqueles que não acreditaram, eles precisam entrar nesse projeto. Futuramente, nós, da associação, queremos que esses mesmos 24 mil hectares tenham capacidade para manter até 300 famílias, com a ajuda dos governos que olham para a gente”.

Outros testemunhos

“O estado trabalha para acabar com a dependência do mercado externo da borracha. Estamos conquistando nossa autonomia” diz Ademir Batista, seringueiro como Duda.

Francois Moriwon, presidente da Vert (empresa francesa que compra a produção de FDL de seringueiros de Assis Brasil) declara: “Nossa empresa quer apoiar um projeto de reflorestamento dentro da Reserva Extrativista Chico Mendes, de onde compramos todo o FDL utilizado em nossos sapatos. Agora precisamos do dobro da borracha do ano passado. Aqui, na Resex em Assis Brasil, é onde tudo começou”

O seringueiro Erivan Silva, da Resex Chico Mendes, em Assis Brasil, confirma o promissor negócio com a Vert: “Antes, quando meu pai ia cortar seringa, vendia a borracha por R$ 0,40. Botava em um burrinho e ia vender na cidade e voltava com nosso mantimento. Hoje, a borracha que eu tiro, vendo em FDL por R$ 11,90 para a Vert”

Um projeto animador

Desde 2011, o governo do Estado investiu mais de R$ 500 milhões na área produtiva e plantou mais seringueiras que em todos os cem anos passados. São mais de R$ 6 milhões de investimento no Florestas Plantadas. Quando começou o programa, existia a produção de 30 mil mudas, hoje a capacidade está acima de 1 milhão de mudas.

Em 2015 foram produzidos mais de 44 toneladas de látex nativo e 196 toneladas de látex de cultivo para a Natex, fábrica de camisinha em Xapuri, movimentando mais de R$ 910 mil.

O CVP (Cernambi Virgem Prensado) tem subsídio de R$ 1,20, e o preço final pode chegar a R$ 4,20 dependendo da demanda do mercado.

A FDL (Folha Líquida Defumada) tem subsídio de R$ 3,50 e o preço final pode chegar a R$ 11,90.

O governo investiu R$ 100 milhões na produção rural do Acre em 2016. Os recursos saíram do Fundo Amazônia, Programa de Desenvolvimento Sustentável do Estado do Acre (PDSA), Programa de Inclusão Social e Desenvolvimento Econômico Sustentável do Acre (Proacre) e do banco alemão KfW.

Por Arison Jardim

Fonte pagina20.net