inte e quatro horas depois de ver rejeitada a redução da maioridade penal para crimes hediondos e graves, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), conseguiu aprovar à 0h50 desta quinta-feira, 2, uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) mais branda costurada por ele com seus aliados.
Após manobra apelidada pelos deputados governistas de “pedalada regimental” e mais de cinco horas de discussão sem manifestantes, mas com direito a dedos em riste e medidas procrastinatórias por parte dos partidos da base do governo, os parlamentares aprovaram por 323 votos a favor, 155 contra e 2 abstenções proposta que determina que jovens com mais de 16 e menos de 18 anos sejam punidos como adultos quando praticarem crimes hediondos, homicídio doloso (com intenção de matar) e lesão corporal seguida de morte.
O texto também determina que os criminosos dessa faixa etária cumprirão pena em unidades específicas que devem ser construídas por União e Estados. Líderes do PSD, do PHS e do PSC apresentaram a emenda aglutinativa que acabou retirando da proposta rejeitada anteriormente pelo plenário o tráfico, a tortura, o genocídio, o roubo com causa de aumento de pena (como uso de arma) e a lesão corporal grave. “Eles foram derrotados porque a maioria da população quer isso”, afirmou Cunha após a votação. “Não há o que contestar. Estamos tranquilos com a decisão tomada”, disse o presidente da Câmara.
Supremo
Deputados governistas acusaram Cunha de golpe e ameaçam recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF). “Vossa Excelência está criando a ‘pedalada’ regimental”, afirmou o deputado Weverton Rocha (PDT-MA), em alusão às pedaladas fiscais de que o governo Dilma Rousseff tem sido acusado e estão em análise no Tribunal de Contas da União (TCU). “Quem não concorda recorra à CCJ (Comissão de Constituição e Justiça da Casa) ou ao STF”, rebateu Cunha.
Para os parlamentares governistas, ele armou um “golpe regimental” por não ter se conformado com a derrota da medida que defende. Os deputados argumentam que essa emenda aglutinativa não tem fundamentação em propostas apresentadas durante o período de discussão da sessão de quarta e, portanto, não poderia ser votada. “Ele não aceita derrota. Esta aglutinativa não tem suporte de conteúdo”, afirmou a líder do PC do B, Jandira Feghali (RJ).
Já o deputado Chico Alencar (Psol-RJ) disse que o presidente da Casa cometeu um “estupro” do regimento. “Há violência na interpretação”, disse. O deputado Alessandro Molon (PT-RJ) disse que Cunha “passa por cima da democracia”. “Qualquer posição neste plenário que prevaleça contra a vossa posição será derrubada”, disse.
O petista disse ainda que quando Cunha perde ele encerra os trabalhos e articula as suas manobras na madrugada. “Vossa Excelência fará uma nova aglutinativa até que sua posição seja imposta nesse plenário.”
O deputado Ivan Valente (Psol-SP) disse que Cunha comanda “o golpe contra a democracia e contra uma decisão soberana do plenário”. “E o faz na calada da noite.” Nesta quarta, após o texto ter sido derrotado, Cunha reuniu parlamentares para articular as emendas que poderiam fazer o tema voltar à pauta.
Aliados de Cunha negam manobra e dizem que a aglutinativa foi regimental, pois tem por base elementos do texto original, não votado. “PECs não votadas podem ter partes do texto aglutinadas em texto de consenso. Não é manobra. É um caminho legítimo”, afirmou o líder do DEM, Mendonça Filho (PE).
Houve críticas ainda ao fato de não ter sido permitida a entrada de público nas galerias. “Não vai ser aberta hoje (quarta) por causa do tumulto de ontem (terça)”, justificou o presidente.
No plenário, o deputado Hildo Rocha (PMDB -MA), que é a favor da redução da maioridade, e Aliel Machado (PCdoB-PR), que é contrário a medida, se desentenderam, o que exigiu que Eduardo Cunha pedisse intervenção da Polícia Legislativa. A confusão começou após Rocha perguntar a Ariel “quantas pessoas ele havia matado”.
Integrantes da chamada “bancada da bala” festejaram a aprovação com selfies, gravação de vídeos para postar em redes sociais e convites para “tomar um gole”. “O ser humano só respeita o que ele teme”, disse o deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ), que não se disse tão otimista quanto ao resultado da votação no Senado. “Lá vai ser complicado. É menos gente. É mais fácil de o governo cercar.”
Tramitação
Mesmo o texto aprovado na madrugada desta quinta ainda precisa passar por segunda votação no plenário da Câmara, antes de seguir para o Senado, onde também terá duas votações.